Reforma tributária e setor imobiliário: será o fim das vantagens das holdings?

21/03/2025 às 16:57

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Reforma tributária e setor imobiliário: será o fim das vantagens das holdings?

Reforma tributária impacta o setor imobiliário, muda benefícios fiscais das holdings e aumenta carga tributária sobre operações imobiliárias 

Por Marina Gonçalves *

A aprovação da Lei Complementar 214/2025, que regulamenta o PL 68/2024, trouxe mudanças substanciais para o setor imobiliário, afetando diretamente a estruturação de holdings patrimoniais e a tributação incidente sobre a aquisição, locação e venda de imóveis.

A substituição do ICMS, ISS, PIS e COFINS pelo Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) e a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) criou uma dinâmica tributária que eleva a carga fiscal sobre diversas operações e restringe benefícios anteriormente concedidos às holdings imobiliárias. Esse novo cenário exige uma reavaliação estratégica por parte dos investidores e empresários do setor, que precisarão ajustar suas estruturas para mitigar o impacto tributário.

A aquisição de ativos imobiliários foi diretamente impactada pela reforma, tornando-se uma operação mais onerosa. No regime anterior, os tributos variavam conforme a natureza da operação e do adquirente, permitindo estruturas que minimizavam a carga fiscal. Com a unificação da tributação sob o IBS e CBS, as transações imobiliárias passaram a ser tributadas de forma mais uniforme, com alíquotas potencialmente elevadas.

A alienação de imóveis, incluindo incorporações imobiliárias, parcelamento de solo e intermediação imobiliária, passa a ser tributada a uma alíquota efetiva de 13,25%, enquanto a locação, cessão onerosa e arrendamento ficam sujeitas a uma alíquota de 7,95%. Esse novo modelo, embora busque simplificação e transparência, impõe um ônus maior para empresas que utilizam ativos imobiliários como parte de sua estratégia patrimonial.

Com esse aumento da carga tributária, a tendência é que os preços dos imóveis sejam ajustados para acomodar os novos custos, reduzindo a margem de rentabilidade das operações imobiliárias. As empresas que não conseguirem compensar esses tributos dentro da cadeia operacional poderão enfrentar desafios na precificação de seus ativos e na competitividade do mercado.

As holdings imobiliárias sempre foram ferramentas estratégicas amplamente utilizadas para gestão patrimonial, sucessão e planejamento tributário. Antes da LC 214/2025, essas estruturas ofereciam benefícios fiscais relevantes, sobretudo na tributação de aluguéis, vendas de imóveis e sucessão patrimonial.

Um dos principais atrativos era a tributação mais favorável sobre rendimentos de aluguéis em comparação à pessoa física. No regime de Lucro Presumido, a carga tributária sobre aluguéis variava entre 11,33% e 14,53%, enquanto uma pessoa física enfrentava a incidência de 27,5% de IRPF sobre essa mesma receita. Além disso, a venda de imóveis por holdings era tributada pelo IRPJ e CSLL, com alíquotas progressivas entre 15% e 25%, enquanto uma pessoa física pagaria até 22,5% sobre o ganho de capital.

Outro benefício expressivo era a eficiência sucessória. Transferir imóveis diretamente para herdeiros implicava na incidência do ITCMD (Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação), cuja alíquota pode chegar a 8%, com possibilidade de aumento nos próximos anos.

No entanto, ao deter os imóveis por meio de uma holding, era possível transferir cotas da empresa, muitas vezes com avaliação patrimonial reduzida, resultando em tributação inferior. Além disso, as holdings conferiam proteção patrimonial, separando o patrimônio dos sócios do patrimônio da empresa, protegendo os bens de riscos jurídicos e financeiros.

Com a nova tributação, a viabilidade das holdings imobiliárias – como estratégia tributária e sucessória – foi substancialmente impactada. A incidência do IBS e CBS sobre aluguéis eleva a carga tributária para 18,83% no Lucro Presumido, um aumento considerável em relação ao regime anterior.

A venda de imóveis também se torna menos atrativa, pois, além da tributação pelo IRPJ e CSLL sobre o ganho de capital, há agora a incidência do IBS e CBS à alíquota de 13,25% sobre o valor da transação, reduzindo ainda mais a margem de lucro dessas operações.

A sucessão patrimonial por meio de holdings também se tornou mais onerosa. A isenção de ITCMD sobre a sucessão via cotas de holdings está sob revisão, o que pode aumentar a carga tributária para herdeiros e tornar essa estratégia menos eficiente. Além disso, uma prática comum no setor imobiliário, a permuta de imóveis, que anteriormente permitia o diferimento do pagamento de tributos, agora será tributada pelo IBS e CBS, com isenção restrita à parcela correspondente à “torna” (diferença em dinheiro na transação).

Apesar da elevação da carga tributária, a LC 214/2025 prevê um regime de transição para empresas que atuam na locação, cessão e arrendamento de imóveis. Para essas holdings, foi estabelecida uma alíquota reduzida de 3,65% do IBS e CBS, porém condicionada ao cumprimento de critérios específicos, que ainda serão detalhados pela Receita Federal.

Esse regime especial impõe um desafio adicional para os administradores de holdings, que precisarão revisar contratos e a estrutura societária para assegurar o enquadramento nas regras que permitam um menor impacto fiscal. A revisão de contratos e a adequação à regulamentação complementar serão fundamentais para mitigar os efeitos negativos da reforma.

Diante desse novo cenário, a manutenção de holdings imobiliárias precisa ser reavaliada sob a ótica da nova realidade tributária. As empresas que utilizavam esse modelo para reduzir impostos sobre aluguéis e vendas de imóveis devem calcular o impacto financeiro das novas alíquotas, considerando alternativas como a adoção de Fundos Imobiliários (FIIs), já que os FIIs continuam a oferecer vantagens tributárias mais favoráveis para investidores que buscam rendimento passivo.

Além disso, a reestruturação patrimonial e a revisão de contratos de locação tornam-se essenciais para reduzir impactos tributários. Dependendo do perfil do investidor e do objetivo da holding, pode ser mais vantajoso reorganizar a estrutura societária, reduzindo a exposição à nova tributação e explorando alternativas mais eficientes.

A Reforma Tributária do Consumo representa um marco na legislação fiscal brasileira, alterando significativamente as regras aplicáveis ao setor imobiliário. As holdings imobiliárias perderam parte de seus benefícios fiscais, enquanto operações imobiliárias, de modo geral, foram impactadas por uma carga tributária mais elevada.

Nesse contexto, a tomada de decisão sobre a melhor estrutura para investimentos imobiliários passa a ser mais complexa, exigindo um planejamento tributário mais sofisticado e um olhar atento para as novas regras. A adaptação ao novo regime exigirá estratégia na estruturação de negócios imobiliários e acompanhamento contínuo das regulamentações complementares que ainda serão editadas. Para investidores e empresários do setor, o momento é de análise, planejamento e adequação às novas regras fiscais.

*Marina Gonçalves, advogada e Head de Wealth Planning e Private Services na corretora Monte Bravo

Artigo publicado no Monitor Mercantil.

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