Como transformar riquezas em impacto duradouro
A história de Ayrton Senna transcende as pistas de corrida. Além de suas conquistas no automobilismo, ele construiu um legado que se perpetua até hoje por meio do trabalho do instituto que leva o seu nome. Este é um exemplo de como famílias podem consolidar seu impacto social, preservar sua memória e planejar o futuro do seu patrimônio.
Fundações e associações têm como base um propósito filantrópico ou socioambiental. No Brasil, esses instrumentos são regulamentados pelo Código Civil. As fundações, conforme o artigo 62, são constituídas com patrimônio destinado a uma causa específica, exigindo aprovação do Ministério Público para seu funcionamento. Já as associações são formadas por pessoas unidas por um objetivo comum e requerem um estatuto social registrado em cartório para regulamentar suas operações.
Essas entidades oferecem flexibilidade para famílias que desejam perpetuar valores e realizar projetos transformadores, combinando objetivos filantrópicos e planejamento sucessório. Um exemplo internacional é a Fundação Bill & Melinda Gates, que aplica parte da riqueza familiar para apoiar a educação e a saúde global, preservando o legado dos fundadores.
No Brasil, o Instituto Ayrton Senna desempenha papel semelhante. Desde sua criação, a instituição investe em educação pública, impactando milhões de crianças e adolescentes. Dados do IBGE apontam que o Brasil possui cerca de 237 mil Organizações da Sociedade Civil (OSCs), incluindo fundações e associações.
Apesar disso, estudos indicam que menos de 2% dessas organizações possuem grandes estruturas e gestão profissionalizada, em contraste com os Estados Unidos, onde existem mais de 1,5 milhão de entidades sem fins lucrativos, das quais muitas são altamente organizadas e administram fortunas consideráveis para filantropia.
Para famílias que buscam inspiração, exemplos como esses evidenciam que fundações não apenas perpetuam a memória de seus criadores, mas também ajudam a gerar impacto duradouro na sociedade.
Além de seu papel social, fundações e associações apresentam benefícios tributários que podem ser atrativos no planejamento patrimonial. Esses veículos, por sua natureza sem fins lucrativos, estão isentos de impostos sobre a renda e o patrimônio, conforme prevê a legislação tributária brasileira (Lei 9.532/1997). No entanto, essa isenção depende do cumprimento rigoroso de regras, como a destinação integral de recursos para finalidades sociais e a apresentação de prestações de contas detalhadas aos órgãos competentes.
No contexto de sucessão familiar, a transferência de parte do patrimônio para uma fundação pode reduzir custos de inventário e impostos sobre herança, além de oferecer proteção contra conflitos internos. Isso garante que o legado seja direcionado a causas significativas, fortalecendo os valores da família por gerações.
Nos Estados Unidos, a cultura filantrópica avançada permite que grandes fortunas sejam transferidas para fundações com incentivos fiscais robustos, favorecendo a continuidade de projetos sociais e ambientais. No Brasil, embora as isenções tributárias existam, ainda há espaço para a ampliação de estímulos que incentivem mais famílias a adotar essas estruturas.
A vida de Ayrton Senna é um exemplo poderoso de como transformar realizações pessoais em impacto coletivo. Sua família utilizou estruturas legais disponíveis para criar um instrumento de transformação social, perpetuando valores que vão além do sucesso esportivo. Para famílias private, o planejamento patrimonial com foco em filantropia permite alinhar riqueza a propósito, fortalecendo laços entre gerações e contribuindo para uma sociedade melhor.
O Brasil ainda apresenta desafios na filantropia, incluindo a necessidade de ampliar incentivos fiscais e a profissionalização das gestões dessas entidades. Contudo, avanços são possíveis quando famílias enxergam o potencial dessas estruturas.
Ayrton Senna, além de ser um ícone nacional, deixou um legado que inspira famílias a utilizar sua riqueza para transformar vidas. No universo do planejamento sucessório, fundações e associações se destacam como ferramentas estratégicas para perpetuar valores, promover impacto social e garantir eficiência patrimonial.
Seja por meio de educação, saúde ou outras causas, investir em iniciativas de longo prazo é uma maneira de alinhar propósito e patrimônio, perpetuando histórias que, como a dele, transcendem o tempo.
(*) Marina Gonçalves é advogada e head de wealth planning da corretora Monte Bravo
Artigo publicado no jornal O Tempo