Decisão de zerar o imposto de importação para uma série de itens foi anunciada ontem; analistas veem efeito limitado ao consumidor

A decisão anunciada ontem pelo vice-presidente da República, Geraldo Alckmin, de zerar o imposto cobrado sobre uma série de alimentos foi muito celebrada por representar um alívio potencial para os bolsos dos consumidores, castigados pela alta inflação, e renovar a esperança de uma avaliação mais positiva do governo, que passa por desgaste. Mas será que a medida vai chegar de fato às gôndolas?
À primeira vista, a leitura de especialistas é que o reflexo para os alimentos na ponta final da cadeia é muito limitado. Segundo Luciano Costa, economista-chefe da corretora Monte Bravo, o impacto será muito pequeno porque os principais produtos na lista de isenção têm uma participação pequena no total de consumo.
“O Brasil é um grande exportador e o preço se forma lá fora, como milho, café e carnes. A oferta adicional que pode vir com a importação acaba não sendo significativa em relação ao tamanho do consumo doméstico”, diz o economista.
O cálculo é simples. Para o açúcar, cerca de 0,6% do consumo é de produtos importados, percentual que cai para 0,2% no caso do milho. No caso do café, 0,1% do que é consumido no país vem da importação. As massas poderiam sofrer um efeito maior, já que os importados ocupam 15% da demanda local nesse caso. Ainda assim, nas contas do economista, a queda no valor dos produtos seria bastante marginal.
Quem também encara com ceticismo a decisão do governo é o BTG Pactual, que cita um “impacto limitado” nos preços locais e para os produtores de alimentos. No caso da carne, as importações são praticamente imateriais e representam menos de 1% do consumo doméstico, segundo o banco. O Brasil está entre os cinco maiores exportadores de carnes do mundo, considerando bovinos, suínos e aves. Conclusões semelhantes podem ser feitas para o milho, açúcar e café.
“Nos setores com menor poder de monopólio, há maior possibilidade de queda dos preços”, diz Igor Rocha, economista-chefe da Fiesp. “Agora, temos que ver também como os governadores irão atuar referente ao ICMS”, completou, fazendo referência à tentativa do governo federal de negociar com os Estados a colocação de tarifas zero também para a cesta básica, já que a isenção das tarifas não atinge a totalidade de produtos.
Há também a preocupação sobre um “ataque pontual para um problema estrutural”, segundo o consultor em finanças Alvaro Bandeira. Segundo ele, no curto prazo, até pode haver algum efeito sobre alguns produtos, mas cresce também o risco de desgaste do governo com a bancada Agro no Congresso – a Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA) já comentou, hoje, que as medidas anunciadas por Alckmin são “ineficazes”.
O risco de impacto na arrecadação do governo também pode acabar cobrando seu preço: ao jogar mais incerteza na economia fiscal, a procura por moeda forte pode aumentar, puxando elevação do dólar contra o real e, no fim da cadeia, mais inflação. “E isso tudo em meio a uma fragilidade de um governo que já mira a reeleição”, diz.
Nota publicada na Veja Negócios.