Cenário econômico: com a aprovação pelo Congresso, a execução do arcabouço fiscal passa a ser o foco da discussão macroeconômica
Por Luciano Costa
O arcabouço fiscal teve um papel importante em coordenar as expectativas e reduzir o prêmio de risco dos ativos ao longo de 2023 ao excluir as trajetórias explosivas da dívida bruta em proporção do PIB. Com a aprovação pelo Congresso, a execução do arcabouço fiscal passou a ser o foco da discussão.
Diante deste cenário, o governo enviou um conjunto de medidas para o Congresso, com o objetivo de elevar a arrecadação em R$ 168 bilhões em 2024. De acordo com estimativas do governo, esse seria o montante necessário de receitas adicionais para obter a meta zero de resultado primário de 2024. Do conjunto de medidas anunciadas, é estimado que cerca de R$ 80 bilhões serão efetivados, o que não garantiria a obtenção da meta, mas possibilitaria que o déficit primário fosse reduzido de 1,1% do PIB em 2023 (excluindo o pagamento excepcional dos precatórios) para cerca de 0,7% do PIB em 2024.
A manutenção do resultado deficitário em 2024 poderá implicar na continuidade da trajetória de elevação da dívida bruta, em proporção ao PIB, que deverá subir de 75,2% em 2023 para 77,6% em 2024. Desse modo, a discussão da meta fiscal deste ano enfraquece a credibilidade do arcabouço e eleva o risco de um cenário alternativo, no qual a busca pelo equilíbrio do orçamento é abandonada.
Entretanto, é importante registrar que a percepção sobre o déficit primário de 2024 será o termômetro do risco fiscal. O foco estará na decisão sobre a meta deste ano e, depois, na execução do orçamento. É previsto um déficit em torno de 0,8% do PIB para 2024 que, embora esteja acima da meta, marcará uma redução importante frente ao déficit de 2,1% – incluindo os precatórios – de 2023.
Mesmo com o ruído fiscal, o quadro doméstico é muito construtivo: a queda de juros, estimula a retomada da economia e cria uma combinação que favorece a atração de fluxos de capitais e a valorização dos ativos. O crescimento menor do PIB em 2024 trará um ritmo de atividade doméstica mais forte e um consumo mais robusto, diferentemente de 2023, quando o crescimento veio do setor externo e da agricultura.
Sabemos que a consolidação de um cenário internacional mais construtivo contribui de maneira importante para um recuo da curva de juros no Brasil. O Copom cumpriu a sinalização e reduziu os juros em 50 pontos base – trazendo a taxa Selic para 11,25% ao ano –, tendo mostrado que esse ritmo de cortes seguirá nas próximas reuniões.
Cenário econômico internacional
Na China, o Banco Central anunciou que reduzirá a taxa de compulsório dos bancos em 50 p.b. no início deste mês. Esta medida tem potencial de injetar aproximadamente US$ 141 bilhões na economia. Considerando as medidas já anunciadas, como flexibilização das regras para compra de imóveis nas principais cidades e a permissão que as províncias emitam dívida para financiar os investimentos em infraestrutura, avaliamos que o crescimento do PIB deverá atingir 4,7% em 2024.
Já o Comitê Federal de Mercado Aberto (FOMC, na sigla em inglês) do Federal Reserve manteve a taxa de juros em 5,50%, seguindo as expectativas do mercado. Além disso, houve a retirada em referência a possível alta de juros nas próximas reuniões.
Inflação nos Estados Unidos
Vale reconhecer que apesar da inflação nos Estados Unidos ter caído nos últimos meses, é preciso também considerar que a atividade segue bastante robusta, o que pode interromper ou reverter essa trajetória. Seguindo um cenário mais realista, a expectativa é que ainda este ano ocorrerá 5 cortes, começando em junho, levando os Fed Funds a 4,25% a.a. no final de 2024. Também é esperado que a volatilidade das Treasuries caia com a taxa dos títulos de 10 anos, oscilando entre 3,75% e 4,25% nos próximos meses.
Há muitas incertezas geopolíticas a monitorar, tais como Estados Unidos e China, Rússia e Ucrânia, Israel e Hamas, mas o fato é que o cenário base para a economia global é construtivo pela primeira vez desde a pandemia.
Perante um quadro global que ganha uma configuração francamente construtiva, a perspectiva para os ativos brasileiros é de continuidade do rali. Os ruídos de curto prazo com dados de atividade mais fortes podem atrasar a continuidade da melhora dos preços dos ativos, mas a tendência de alta deverá ser retomada quando o FED e outros Bancos Centrais estiverem na iminência de iniciar o ciclo de corte de juros, que esperamos que ocorrerá no 2° trimestre desse ano.
Artigo publicado no Suno Notícias: clique aqui.
José Luciano da Silva Costa é economista-chefe e sócio da Monte Bravo. Formado em economia pela FEA-USP e com mestrado em economia pela FGV-SP. Durante sua carreira se especializou em política monetária, modelagem econométrica e a cobertura de economia local e global. Com experiência de mais de 20 anos foi Gerente Executivo de Renda Fixa e Macroeconomia da Fundação Petrobras de Seguridade Social (PETROS). Anteriormente, foi economista sênior e economista-chefe na Bradesco Asset Management, Itaú Asset Management e Unibanco Asset Management. Também trabalhou como economista pleno no Banco Itaú e no ABN AMRO Bank.