Por Rebeca Nevares, Sócia da Monte Bravo.
No início do mês repercutiu em toda a imprensa a fala do Ministro da Economia, Paulo Guedes, sobre o rompimento do teto de gastos. Segundo ele, romper a regra, que é constitucional, “tacaria fogo no país”. Mas o que aconteceria caso isto de fato ocorresse? Se você acha que o mercado simplesmente desabaria, leia este artigo até o fim.
Em primeiro lugar, vale uma contextualização sobre “pegar fogo”. Todos sabem que o Brasil vinha em um ritmo interessante de reformas e projetos de concessão que, sem dúvida nenhuma, foram atrapalhados pela pandemia. Empresas diminuíram o ritmo dos investimentos, o fiscal do país se deteriora rapidamente e a dívida pública brasileira se aproxima de 100% do PIB.
E isto é um problema sério, pois em um cenário como este, o Estado perde a capacidade financeira afetando o volume de recursos direcionados para áreas fundamentais como infraestrutura e saneamento.
Além disso, quando o risco/país aumenta e as expectativas em relação à política fiscal de longo prazo pioram, o prêmio cobrado pelo mercado é maior. Na prática fica mais caro para o governo pegar dinheiro emprestado.
No início de setembro a Moody’s, famosa agência internacional de classificação de risco, apontou o teto de gastos como a principal âncora fiscal do Brasil. E destacou que um eventual abandono da ferramenta sem uma contrapartida realista poderia prejudicar a retomada econômica.
Além do mais, quando há este tipo de incerteza, o investidor fica receoso e acaba retirando seus recursos do país em busca de ativos mais atraentes no exterior. Hoje, por exemplo, a nota do Brasil estabelecida pela própria Moody’s é de “Ba2”, abaixo do grau de investimento.
Isto sem falar no risco político e jurídico que o presidente da república correria caso a regra fosse quebrada.
Para ilustrar um pouco do que eu quero dizer, podemos olhar para algumas informações recentes do nosso Banco Central sobre o fluxo cambial. Os dados do órgão mostram que desde o início de 2020 já foram retirados mais de US$15 bilhões do país, o maior volume já registrado desde o início da série.
E o cenário tende a piorar em breve mesmo com o fim da pandemia.
Respondendo de forma objetiva o questionamento inicial do artigo, uma eventual quebra no teto de gastos pode fazer com que realmente o mercado desabe.
Contudo, caso este rompimento venha acompanhado de reformas estruturais como a administrativa, que traria maior autonomia para o governo no gerenciamento das despesas, o estrago pode ser menor.