
A temporada brasileira dos balanços referente ao quarto trimestre de 2024 começa nesta quarta (5). Para especialistas consultados pelo Valor Investe, as projeções para quase todos os setores são de crescimento na base anual, embora com desacelerações pontuais na comparação contra o trimestre anterior – um dos períodos mais fortes para muitas empresas. A melhoria dos resultados anuais não significa, necessariamente, que especialistas estão otimistas com o mercado de ações brasileiro.
“O último período foi marcado pelo aumento de receita, melhoria na geração de caixa. No geral, 2024 foi um bom ano para as companhias da nossa bolsa, mas não refletiu na performance do Ibovespa [que caiu 10,4% no ano passado]”, resume Bruno Benassi, analista da Monte Bravo.
- De acordo com estimativas da XP para as 150 companhias da bolsa acompanhadas pela casa, as receitas e o lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização (Ebitda, na sigla em inglês) devem vir, em média, 8% e 6% maiores na base anual, respectivamente.
Mas a evolução projetada pela XP fica desanimadora diante da escalada do dólar e da inflação no último período.
O dólar saiu de uma média de R$ 4,96 no quarto trimestre de 2023 para R$ 5,83 no mesmo período de 2024 – alta de 17,5%. Já a inflação medida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) fechou o período de outubro a dezembro de 2023 com alta trimestral acumulada em 1,08%, contra 1,51% na mesma janela um ano depois.
Já a Selic, que ao fim de 2023 estava em 11,75%, mas em trajetória descendente – rumo aos 9% ao ano no fim de 2024, conforme apostas dos investidores – inverteu o rumo. Após a pausa nos cortes com a taxa básica em 10,5%, em setembro passado, ela voltou a subir. Entrou o último trimestre a 10,75% e fechou o último ano em 12,25%. E em ascensão.
Os indicadores mostram um ambiente mais nocivo para os resultados das companhias. Mas o cenário ainda não deve se refletir integralmente nesta temporada de balanços.
“Esta temporada de resultados é um ‘não-evento’. A piora macroeconômica e as incertezas que escalaram do começo de dezembro até o fim de janeiro foram muito relevantes. É como se o que aconteceu no fim do ano passado estivesse muito distante de nós hoje. Por isso, mais importante que os resultados, serão a postura e as respostas dos executivos nas teleconferências sobre como as empresas se prepararam para enfrentar o que virá neste ano”, pondera Benassi.
Mas, calma lá, não é que os resultados do quarto trimestre de 2024 não importam.
- Só que os balanços desta temporada serão mais relevantes como retratos da situação financeira das empresas e de como devem atravessar 2025, “que com certeza vai ser mais difícil do que 2024”, acrescenta o analista da Monte Bravo.
Entre os pontos de atenção para o mercado brasileiro, especialistas citam: a desaceleração do crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) e da massa salarial real, a elevação da Selic, além do impacto do dólar mais caro.
Neste sentido, investidores precisam ficar alertas para as empresas sensíveis a juros e ao câmbio, que já podem dar sinais de deterioração nos resultados do último trimestre a um nível periclitante. E este será só o começo.
“No geral, empresas mais dependentes da economia doméstica devem ter crescimento das receitas em função do PIB do Brasil no último ano. O aumento nos lucros, contudo, tende a decepcionar por conta da pressão nas margens ocasionada pela alta do dólar e do custo elevado das despesas financeiras”, avalia Valter Bianchi Filho, sócio-fundador da Fundamenta Investimentos.
Entre os setores que devem se destacar positivamente nesta temporada, os especialistas formam consenso sobre bancos e frigoríficos.
Mas os resultados das duas gigantes da bolsa brasileira, Vale e Petrobras, devem desacelerar na base anual em função da queda dos preços do minério de ferro e do petróleo. Para essas companhias, especialistas monitoram indicativos de aumento das margens em 2025.
“Empresas exportadoras que conseguiram ser eficientes nos seus controles de custos, as empresas domésticas mais defensivas – que têm maior segurança nos seus contratos e, com isso, maior capacidade de repassar inflação [casos de empresas de energia e saneamento] – e os bancos bem capitalizados e eficientes na diversificação de receitas devem apresentar resultados sólidos”, afirma Roberto Sertã Costa, sócio e gestor de renda variável da Mag Investimentos.
- Também há unanimidade entre analistas na outra ponta, a dos setores mais prejudicados pela deterioração econômica do fim do ano passado. Entre as empresas que preocupam, estão varejistas, produtoras de alimentos e as de locação de veículos.
“Companhias domésticas mais cíclicas [cujos resultados estão mais atrelados aos ciclos econômicos] vêm sofrendo desde a guinada na política monetária”, acrescenta Costa.
Empresas que podem agradar – e o quanto isso importa na bolsa
Os frigoríficos são citados por todos os especialistas entre aquelas empresas que devem entregar bons resultados nos balanços referentes a outubro a dezembro do último ano.
“Destaque no setor para JBS e BRF, que ganham peso no cenário de frango, cuja exportação no ano passado continuou muito forte, com reforço da demanda, e o preço do milho ainda não tinha recuperado tanto. No quarto trimestre, as margens devem vir robustas, com volume de vendas expressivo, que é o melhor dos mundos”, diz Victor Nishioka, analista da Ativa.
João Abdouni, analista da Levante, entende que, por conta da elevação no preço do boi e do milho (que representam custos para as operações), é esperado que o quarto trimestre mostre uma piora em relação ao terceiro trimestre. Mas isso porque a base de comparação – o período de julho a setembro – estabeleceu um patamar acima do normal para o setor.
Ele destaca ainda que as operações de bovinos na América do Norte foram um fator negativo para as operações do quarto trimestre da JBS e da Marfrig.
“No entanto, ainda projetamos bons resultados para as empresas”, diz. “É esperado que as margens do segmento de bovinos melhorem nos próximos trimestres, ajudando a reduzir o índice de alavancagem da JBS e elevando a distribuição de dividendos, informações que já foram divulgadas pela própria administração.”
Para a Levante, a escolha no setor é a JBS, líder global de proteínas. “A empresa deve entregar bons números nos próximos 12 meses e reduzir a relação da dívida líquida sobre Ebitda [conhecida como alavancagem] de 2,8 vezes para um patamar próximo a 2 vezes. Com isso, a empresa teria espaço para seguir se valorizando na bolsa”, defende Abdouni.
Mas Benassi tem suas ressalvas ao setor. Embora concorde com outros especialistas que JBS e BRF devem ser os destaques setoriais, lembra que o mercado já começou a ver uma diminuição nas margens do comércio de frango, o carro-chefe para os resultados das duas companhias em 2024.
“Precisamos ter um pouco mais de ideia de como essas companhias estão vendo a evolução das margens neste ano, principalmente para o frango exportado”, pondera o analista da Monte Bravo.
Leia a reportagem na íntegra: Valor Investe.